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DILMA: 2ª ETAPA DO GOLPE É TIRAR LULA DAS ELEIÇÕES
REUTERS/Andres Stapff
O golpe que tirou do poder a ex-presidenta Dilma Rousseff completa um ano na próxima quinta-feira (31). Nessa data, em 2016, os senadores decidiram, por 61 votos favoráveis a 20 contrários, afastar definitivamente a petista do cargo, mesmo sem comprovar que ela tenha cometido crime de responsabilidade. "Eles inventaram um processo para me tirar do governo. E usaram uma maioria construída por compra de votos, que são os mesmos 267 que garantem a impunidade do presidente ilegítimo Temer", afirma Dilma um ano depois, em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato.
Rousseff também comenta sobre a situação de perseguição política e jurídica ao ex-presidente Lula, sobre a proposta do governo golpista de privatização da Eletrobras e sobre a necessidade de lutar contra o golpe. "Todos nós vamos ter de ser capazes de nos dedicar a tentar tirar o Brasil dessa encruzilhada em que ele se encontra", afirma. Confira a seguir ou ouça a versão de áudio aqui, que foi ao ar no Programa Brasil de Fato, em emissoras de São Paulo, Belo Horizonte e Recife.
Um ano após o processo de impeachment, como a senhora olha para tudo o que aconteceu?
Eu considero que o processo de impeachment foi um golpe porque não tinha crime de responsabilidade. Eles inventaram um processo para me tirar do governo. E usaram uma maioria construída por compra de votos, que são os mesmos 267 que garantem a impunidade do presidente ilegítimo Temer. É a mesma composição do Congresso, que foi construída pelo [ex-deputado] Eduardo Cunha e que me tirou através de um processo absolutamente sem base e sem fundamento, hoje reconhecido pelo mundo inteiro. A história foi bastante desagradável para os golpistas. Prendendo-os, deixando claro quem eram eles.
O golpe também esbarra nessa perseguição ao ex-presidente Lula?
Eu não acho que o golpe é um ato apenas. Meu impeachment é a primeira etapa do golpe, a segunda etapa está se mostrando bastante conservadora e muito reacionária, de um lado, e extremamente radicalizada de outro. Faz parte dessa segunda etapa tirar o Lula da eleição de 2018, criando factoides judiciários para ele. Todo esse absurdo processo do triplex, na qual o próprio juiz [Sérgio Moro] reconhece que os fundamentos da acusação não existem. Ele próprio, o juiz, faz acusações que não deveriam ser feitas. Esse segundo aspecto do golpe tem um lado que é a politização da Justiça. Quando um juiz diz: "olha, eu não li, mas acho que está correto" e fala fora dos autos... Aquela questão que é básica na democracia, que todos são iguais perante a lei, ela deixa de existir. Você cria uma justiça e usa a lei para destruir civilmente o que eles consideram como o alvo inimigo que tem que ser destruído.
O Congresso agora está propondo uma reforma política, com o "distritão", e alguns partidos falam sobre parlamentarismo. Isso também está incluído nesse contexto de golpe?
Você tem uma terceira fase, que pode ser simultânea, que é essa proposta de parlamentarismo. Toda vez que as classes dominantes, os setores conservadores, se encontram em uma situação difícil, eles apelam para o parlamentarismo. Esse parlamentarismo, combinado com o "distritão", tem por objetivo criar um sistema em que a força do dinheiro vai ser absolutamente dominante. Não é nem hegemônica, vai ser dominante. O objetivo é tirar a representação progressista, popular, de esquerda, de centro-esquerda, do mapa. O grande objetivo do golpe estratégico é esse. O tático imediato é impedir que a Lava Jato chegue a eles. Todos os oportunismos fisiológicos que eles são capazes. Agora, o grande objetivo era, como perderam quatro eleições seguidas, quatro eleições presidenciais, chegara
m à conclusão que a democracia não lhes convinha. Eles não são democratas.
Qual seria uma reforma política ideal para o país, na sua opinião?
Vivemos em uma situação extremamente difícil. O Brasil tem 35 partidos. Você há de convir comigo que não existem 35 projetos para o Brasil. O que se vê e que explica uma parte do golpe foi uma ocorrência grave, que é logo após a Constituinte, e a Constituição Cidadã de 1988: se construiu no Brasil um centro democrático. No centro estava o velho MDB, com Ulysses [Guimarães] e outros, que eram progressistas, eram de centro-direita, ou centro-esquerda. A grande maioria deles não era excessivamente conservadora. Alguns até eram, mas olhavam o país, respeitavam o Brasil.
Esse centro democrático se perdeu nesses caminhos dos governos pós-1988. E chegou no período Lula e floresceu mais no meu, a construção de um centro que passou progressivamente a ter uma hegemonia de centro-direita. Essa hegemonia, que está expressa no grupo do Eduardo Cunha e no controle que ele tinha do chamado centrão, é extremamente grave. Porque nessa discussão sobre as formas que assumiu a coalizão presidencial, é fundamentalmente não por causa dessa coalizão, é porque o centro foi dominado, pode se dizer, por uma quase extrema direita. Extrema direita pelos métodos, pela concepção de mundo, pelas lutas civilizatórias as mulheres, contra os gays, contra LGBT, contra negros... Enfim, extremamente conservador do ponto de vista civilizatório, mas também econômico e social.
Você tem uma estrutura de regulação eleitoral que facilita também essa proliferação de partidos, porque não tem cláusula de barreira. Ao não ter cláusula de barreira, duas cláusulas democráticas - que é o fundo partidário e o acesso gratuito à televisão - passam a ser moeda de troca. Cria-se partidos que não têm compromisso com a questão de um partido, que é ter acesso ao governo, e esse partido passa a negociar tempo de televisão, comprando e vendendo, e passa a negociar também, o fundo partidário, a que ele tem acesso. Passa a ser um negócio. Então é necessária uma reforma, mas você não resolve a reforma política com "distritão" ou "distritão misto" etc. Você resolve mudando a cláusula de barreira e caracterizando e dando valor ao partido. Não há como você ter democracia sem partido.

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